segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

Uma ida ao Barbeiro. Ou uma viagem no tempo.


Nunca fui de grandes cabeleiras à excepção, em meados da década de setenta, de usar o cabelo um tudo nada mais comprido que tapasse ligeiramente as orelhas. Mas nada de exageros. Em pequeno era levado, pelo meu tio Laurêntino, à barbearia de João Lino. Ficava, e fica, aqui mesmo ao lado de casa. Um saltinho de pardal. Ele já lá está há cinquenta anos. É obra!


Ali me contorcia, sentado na prancha apoiada nos braços da cadeira articulada, tapado até aos pés pela bata, onde o Mestre me irritava com os "tic's tic's" próprios da tesoura e me arripiava com a água fria no pescoço para o aparo, e retoque final do corte de cabelo, agora com a navalha de barba. E eu, muito quietinho, não fosse a navalha deslizar e fazer aqueles cortes que obrigavam, depois, à utilização do lápis de estanque. E se aquilo ardia...

Mais tarde, porque passava grande parte do tempo no Largo Vasco da Gama, onde o meu pai tinha a sua loja, comecei por visitar a barbearia do Leonel Vacas, ali mesmo defronte da Farmácia do Snr. Joaquim Cabeça, junto ao jardim do Largo João de Deus. O inquilino seguinte dessa barbearia, e naturalmente o meu barbeiro, foi o Manuel Gomes (Mona).

Quantas vezes jogámos à volta do Corêto da Musica... "P'ra que lado???"

Já estudante no Externato Liceal, bem perto onde se encontra agora a Junta de Freguesia, onde foi a escola "Conde Ferreira", pois, dali à barbearia do Mestre Joaquim Salvador era um ápice. Com a mania de querer aprender a tocar viola, lá ia todo lampeiro, nos inicios da década de setenta, aparar as guedelhas e enzoinar os ouvidos do paciente Mestre, que também tocava viola e guitarra.

Mas mais barbeiros havia nesse tempo. O Álvaro Agnelo (Xané), o António Conceição (Palucho), o Fernando Ferreira... pelo menos uns seis em simultâneo.

No sábado, dia 2, pensei em "ajeitar o maço" e lá fui ter com o meu "coiffeur privé".

Sempre se dá dois dedos de conversa, uma piada, uma risada. Voltei ás origens. Quarenta e oito anos depois da primeira vez ali me sentei. As tesouras deram lugar ao pente eléctrico (Oh João pode ser o 5 se fazes favor). O velho rádio, onde se ouviam os relatos do Glorioso Benfica, foi substituido por uma pequena televisão. O espaço das velhas cadeiras de madeira ocupado por um cadeirão de três lugares.

Esta é uma profissão quase em desuso. Em extinção mesmo. Agora são as cabeleireiras. Por aqui, num espaço tão pequeno, contam-se.... cerca de oito!

Um dia o falecido Constantino Cegonho, também ele barbeiro, mas em Paris, disse-me: "Vais para o pé de mim. Eu ensino-te e ficas no meu lugar quando me reformar".

Hoje penso que talvez tenha feito uma grande asneira em não ter ido. Era capaz de estar rico!

Não fui... paciência. Não sou um homem rico, mas sou um rico homem.

4 comentários:

  1. A um trabalho menor nas entradas é acrescido de um suplementar das patilhas.
    Um abraço
    RM

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  2. E...um homem cada vez mais monárquico!...

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  3. Oh Raúl!!! Imagina se fosses "coiffeur" em Paris.
    A esta hora, se calhar, em vez de seres bem casado com a Paula e ter 2 rapagões, tinhas um "chien", usavas rabo de cavalo e andavas numa lufa-lufa, para a aprovação da lei do casamento gay, para poderes casar com o teu "namorado".
    Ahahahahah !!! vade retro satanás !

    Abraço

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  4. Bem observado, Nuno. Cruzes, canhoto! Se calhar o melhor mesmo foi ter ficado por cá. Nem me tinha lembrado desses pormenores. Só te faltou dizer que iria passear o chien no "bois de Bologne". Mas áparte dessa tua "visão" negativista, penso que nunca iria mudar este meu estatuto de macho latino que pretendo conservar. Já agora diz-me.... Conheces alguém que tenha tido essa fatalidade que acima referes?

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